trocando uma ideia com nossa caríssima querida colega amiga daniela, relembro meus bons velhos idos tempos de estudante de filosofia, onde bebiamos na fonte de célebres filósofos, recitávamos longuiiiisimos poemas, entornávamos ainda mais longuíiiiiissimas garrafas de vinho e falávamos bobagens por longo tempo nos fins de tarde no barbalho.
relembro principalmente um cara muito louco, com um bigode maior que o do indiano da novela das oito, e com o nome maior ainda, mas que só se pronuncia nit (nietsche, acho que é assim que escreve).
lembrança que vem a minha mente pelo que esse cara chamava de conhecimento trágico e que nossa amiga parece entender muito bem, pois não se esquiva de por o dedo bem fundo na ferida.
pondo o dedo da ferida relembrei tambem de um poema de um cara nietschianoplatônico. vcs já devem ter lido "tudo vale a pena, quando a alma não é pequena" ou "navegar é preciso", essas coisas bonitinhas. mas o trágico é urgente! então pessoa na pessoa:
Poema em linha reta
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachadoPara fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.
Toda a gente que eu conheço e que fala comigo Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia! Não, são todos o Ideal, se os ouço e me falam. Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil? Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses! Onde é que há gente no mundo?
Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?
Poderão as mulheres não os terem amado, Podem ter sido traídos - mas ridículos nunca!
E eu, que tenho sido ridículo sem ter sido traído,
Como posso eu falar com os meus superiores sem titubear?
Eu, que venho sido vil, literalmente vil,
Vil no sentido mesquinho e infame da vileza.
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